ENTREVISTA: DIOGO HUBNER!
Diogo Hubner pertence a uma geração de jogadores que mudou o patamar do Brasil no handebol masculino internacional. Com performances consistentes em mundiais e torneios amistosos, jogando de igual para igual contra potências europeias, a seleção brasileira masculina é hoje respeitada e cria expectativas para seu desempenho no Rio 2016. Em Toronto essa mudança de patamar foi coroada com um grande título, que há algum tempo o Brasil não conquistava. E lá estava Diogo Hubner como um dos grandes protagonistas.
Apesar de estar no auge de sua performance desportiva e de ter ainda pela frente bons anos de alto rendimento, Diogo já disputou 15 Ligas Nacionais, como ele mesmo observa nessa entrevista. São 15 temporadas vivenciando as mudanças, o crescimento e as idas e vindas do nosso amado handebol dentro do Brasil. Difícil encontrar alguém que possa falar com mais propriedade sobre o handebol brasileiro…
Demonstrando com as palavras a mesma inteligência que sempre demonstra jogando handebol, Diogo nos respondeu sobre vários assuntos, dando mostra de que ainda pode realizar muito em prol do handebol brasileiro, tanto dentro como fora das quadras.
E muito obrigado a Diogo Hubner por nos conceder esta entrevista!
Pan de Toronto
Trave Quadrada – Não tem como começar essa entrevista sem falarmos da recente conquista nos Jogos Pan Americanos de Toronto.
Desde a história recente (derrotas em Guadalajara 2011, Buenos Aires 2012, Canelones 2014), até a maneira como a final se desenvolveu, tudo teve uma carga de dramaticidade digna de um roteiro de filme. No seu caso, mais ainda: depois de uma atuação brilhante, assumir a responsabilidade de bater um 7m naquelas circunstâncias, e ainda ter que se recompor para jogar a prorrogação. Passados alguns dias da conquista, conte um pouco para gente como foi viver todas essas emoções naquela grande final.
Diogo Hubner – Primeiro obrigado pela oportunidade de estar falando um pouco sobre Handebol.
Sem dúvida alguma o jogo envolvia “muitas histórias”. Desde o Pan de Guadalajara, até a então recente derrota (muito dura diga-se de passagem) em Canelones no ano passado. Entramos na partida sabendo o quanto nossa missão era difícil e que teríamos que ser perfeitos para que pudéssemos sair vitoriosos. Muita pressão e uma responsabilidade muito grande antes do jogo poderiam nos atrapalhar, mas controlamos os ânimos e conseguimos conquistar nosso objetivo. Sobre o 7 metros, confesso que foi duro. Estava confiante no momento em que peguei a bola, não tinha errado nenhum durante toda competição (10/10), vinha de um segundo tempo muito lúcido, muito tranquilo, mas não podia esquecer que do outro lado tinha também um goleiro experiente e que levou a melhor. Graças a Deus e a toda equipe revertemos todo o cenário psicológico contra que se desenhou naquele momento e conseguimos sair com a vitória.
TQ – A não ser pelo jogo de Canelones, nas finais pan americanas recentes me pareceu que o Brasil estava sempre um pouco melhor que a Argentina, mais estruturado talvez, mas em algum momento abandonava essa estrutura e acabava perdendo. Agora em Toronto, até antes da final o Brasil havia tido apenas 11 exclusões em 4 jogos, e a Argentina 17, mas na final o Brasil teve 5 exclusões e a Argentina apenas 2.
A Argentina é um adversário que é psicologicamente mais difícil de enfrentar ou isso é um mito?
DH13 – Acredito que seja um mito. Eles têm uma qualidade muito grande, principalmente um ataque muito bom, e souberam vencer essas competições. Acho que quando se leva uma carga emocional muito grande para o jogo eles levam vantagem, é característico dos Argentinos. São dois times que evoluíram muito e são bem equiparados, por isso, com exceção a Canelones, os placares são bem apertados.
TQ – Muito se fala ao tentar explicar o crescimento nos resultados das seleções brasileiras de handebol, tanto masculina quanto feminina. Desde que Morten Soubak assumiu no feminino e que Jordi Ribera voltou ao comando no masculino, ambas as seleções trabalham com um grupo de 20 e tantos atletas, e que não muda muito, é bem constante. Qual a importância de se estabelecer essa base de atletas que irão trabalhar na seleção? Você acha que isso foi importante para o crescimento citado?
DH13 – Sem dúvida alguma. Posso falar pela seleção masculina. De fato o grupo não muda muito de uma convocação para outra, se tem uma base sólida e os atletas sabem muito bem quais são suas funções dentro do grupo. Já são 3 anos de trabalho padronizando e se mostrando um “jeito Brasileiro” de se jogar Handebol. O Jordi tem muito mérito nisso, com o trabalho integrado nos acampamentos e nas seleções masculinas. O atleta desde muito novo já sabe a maneira que terá que jogar quando estiver na seleção, assim criamos um padrão. Acho que esse é o segredo do sucesso.
Mundial 2015
TQ – O Brasil teve um ótimo desempenho no Mundial do Catar em 2015, depois de outro grande desempenho que havia tido na Espanha em 2013. Como foi a experiência, dentro e fora de quadra, de jogar esse Mundial 2015, que foi tão único em matéria de estrutura e recursos?
DH13 – Os dois mundiais foram incríveis. Na Espanha surpreendemos o mundo com a nossa defesa, e nos classificamos em terceiro em um grupo muito difícil, deixando para trás Montenegro, Argentina e Tunísia. Fizemos um jogo memorável contra Rússia nas oitavas de final onde caímos por um gol de diferença. O fator surpresa ali foi fundamental para a nossa colocação histórica. No Qatar esse ano as pessoas já nos conheciam, conheciam nosso estilo de jogo, e muitos atletas da nossa seleção já atuando na Europa nos trouxe um pouco mais de confiança. Fizemos jogos brilhantes e elevamos o nosso nível de competição, até que caímos para Croácia também por um gol de diferença em um jogo em que a arbitragem foi muito polêmica. Sempre falamos que está chegando nosso momento. Precisamos estar sempre nos classificando para a fase mata-mata para que um dia possamos passar por ela! Esse é o objetivo da seleção! Estar sempre subindo degraus.
Olimpíadas
TQ – Até as Olimpíadas do Rio, a seleção masculina ainda disputará alguns torneios amistosos, como o da Alemanha em novembro, e o Pan de Handebol já em 2016. Você acha que a expectativa dos jogadores por estar no grupo final que vai às Olimpíadas pode atrapalhar o desempenho do Brasil nestes torneios, ou, pelo contrário, só tem a ajudar?
DH13 – Acho que atrapalhar não. Claro que todos querem estar no grupo de 14 atletas que disputarão os jogos do Rio ano que vem, mas acima de tudo todos querem estar na seleção, seja qual for a competição. Acho que essas competições servirão de testes para saber em qual nível estaremos nessa reta final de preparação.
Início da carreira
TQ – Hoje em dia você serve de espelho para muitos jogadores, que te observam para tentar aprender e evoluir. E você, quais foram os jogadores em quem você se inspirou no início da sua carreira e quais qualidades desses jogadores você buscava adquirir ao observá-los?
DH13 – É engraçado porque procuro observar jogadores que tenham as mesmas características físicas que a minha. Tinha um central sueco, que hoje é treinador, Magnus Andersson, que era fantástico. Naquela época não era fácil conseguir material, então sempre que meus treinadores em Niterói arrumavam alguma fita VHS eu ficava vidrado vendo handebol. Talant Dujshebaev, Ljubomir Vranjes, Jackson Richardson, Enric Masip Borras e mais recentemente Ivano Balic foram alguns desses nomes. Mas o primeiro que ouvi falar, até por ter nascido na mesma cidade, estudado no mesmo colégio e jogado no mesmo clube foi o Bruno ( Bruno Souza), que logo foi jogar em SP e depois na Europa. Era um caminho que eu naquela época queria seguir.
TQ – O central exerce uma liderança natural devido à própria função que desempenha em quadra. Imagino que não seja fácil para um garoto de 19, 20 anos chegar num time que tem jogadores mais velhos e experientes e liderá-los taticamente, ainda que no início seja por poucos minutos por jogo. Nesse sentido, é mais difícil para quem joga como central fazer a passagem da base para o adulto?
DH13 – Acho que é ao contrário. Acho que é mais fácil. Geralmente são atletas de personalidade, que se impõem justamente pela função que exercem. Se você conseguir mostrar que tem capacidade e conquistar a confiança dos companheiros e do treinador tudo se torna mais fácil.
Mundial Jr 2003
TQ – Nesse momento o Brasil está sediando um Mundial Júnior pela segunda vez. Na primeira vez, em 2003, você estava naquela equipe que conseguiu um histórico oitavo lugar naquele mundial, o que foi então a melhor colocação de qualquer seleção brasileira em mundiais. Quais são as suas principais lembranças daquele torneio?
DH13 – De um grupo que treinou demais. Naquela época era muito difícil ter informações sobre outras equipes, tínhamos uma equipe com uma média baixa de altura, então treinávamos. Corríamos muito. Muito mesmo. Um grupo que queria muito um lugar ao sol e elevar o nome do nosso esporte. Um grupo de jogadores que se tornou um grupo de amigos.
TQ – Ainda sobre o Mundial Júnior de 2003, no início da preparação para o Pan de Toronto você postou nas redes sociais uma foto com alguns remanescentes daquela competição. Os jogadores que disputam juntos os mundiais e pan americanos de base mantêm uma relação especial para o resto da carreira?
DH13 – Acho que quando se passa muito tempo junto se criam afinidades. Naquele grupo foi assim. Cada um tomou um rumo, uns pararam de jogar, mas a amizade prevalece. Sempre lembramos de algumas situações daquelas competições, dos treinamentos. É muito legal olhar para trás e ver que não construímos só algo dentro do esporte, mas que construímos amizades e histórias que ficarão em nossas memórias para sempre.
A Metodista
TQ – Você é um jogador muito identificado com a Metodista, por toda sua história nessa equipe. Como foi a experiência de sair por uma temporada e, especialmente, como foi voltar na atual temporada para liderar um elenco cheio de jovens talentos?
DH13 – De fato foi diferente. Joguei 12 anos na Metodista e fui jogar em Taubaté com outros 5 jogadores que também atuavam comigo na Metodista há algum tempo. Foi uma experiência bacana, ver como são as coisas em outra equipe. Foi um momento de muito crescimento para mim. Retornar também teve um gosto muito especial. Não vivemos aqui na Metodista um momento fácil nos bastidores, voltei com o intuito de devolver a Metodista ao seu lugar, que é entre os grandes, disputando as finais de todos os torneios possíveis. Reerguer a instituição dentro e fora da quadra é um dos meus objetivos e sonhos.
TQ – A Metodista fez um primeiro turno irretocável no Paulistão, vencendo todos os seus jogos. Agora em Agosto volta o campeonato, a Metodista já joga no dia primeiro. Você acha que vão conseguir manter o mesmo nível do primeiro turno?
DH13 – Será um desafio muito grande. Perdemos alguns atletas de expressão na equipe, seja por lesão ou seja por outros motivos. Teremos trabalho redobrado nesse segundo turno. Será muito difícil mantermos esse nível, mas vamos trabalhar para isso.
TQ – O Pinheiros (Gustavo Rodrigues e talvez Julian Souto Cueto), a Metodista (Acácio Moreira) e o São José (Leo Santos e Thiago Ponciano) vão perder jogadores que têm sido importantes para estes times. Taubaté volta para o segundo turno ainda mais favorito do que entrou no primeiro?
DH13 – Sem dúvida alguma. Taubaté montou um time ao meu modo de ver para jogar o mundial de clube e obter uma grande posição nesse torneio. Eles com certeza continuam favoritos para vencerem as competições nacionais.
TQ – Com o início do segundo semestre, já se começa a pensar na Liga Nacional 2015. Qual a importância que essa competição tem para o handebol brasileiro e qual a sua expectativa para a Liga Nacional 2015?
DH13 – Infelizmente, depois de jogar 15 ligas seguidas não participarei do torneio. A Metodista, por motivos internos, decidiu não entrar na competição no naipe masculino esse ano. Acredito que será uma boa competição para aqueles que participarão. Muito legal ver Londrina e São Caetano de volta ao cenário nacional disputando a Liga. Acredito que Taubaté é favorito e que leve o Tri Campeonato da competição.
Futuro do Handebol
TQ – Para finalizar, gostaria de te perguntar sobre sua expectativa quanto ao futuro do handebol no Brasil.
Apesar de jovem, você já passou por várias fases do handebol no Brasil, momentos de maior e menor exposição do esporte. Quando vemos ginásios lotados no Torneio 4 Nações, no desafio Brasil x Noruega e agora em Uberaba no Mundial Júnior, é impossível para nós espectadores não acreditarmos num grande futuro para esse esporte no Brasil. Mas e para você, que vivencia isso tudo desde dentro, a impressão também é de evolução e de grande esperança para o futuro?
DH13 – Acho que o Handebol é um grande produto a ser explorado. Muita coisa melhorou dentro do esporte, mas precisamos fazer cada vez mais. As dificuldades não são só para o handebol, e sim para todos os esportes olímpicos no Brasil. Mas sou esperançoso de que um dia vamos atingir um nível grande de profissionalismo. Trabalho para isso.
TQ – Por fim, gostaria de te agradecer pela entrevista e por toda a atenção que você dá aos aficionados por handebol através das redes sociais, contribuindo muito para o crescimento desse esporte no Brasil.
DH13 – Obrigado pelo espaço. O meu intuito é sempre fazer o nosso esporte crescer. Contribuir de uma forma ou de outra para isso é a minha meta! Parabéns pelo trabalho frente a esse canal de informação, que é sempre bem informado e com colocações que sempre visam o crescimento da nossa modalidade com opiniões e criticas sensatas. Conte comigo sempre que precisar. Grande trabalho!
Foto: FB da CBHb.